Entenda por que Israel quebrou cessar-fogo e retomou a guerra em Gaza
O cessar-fogo entre Israel e o Hamas, que durou apenas dois meses, se mostrava instável há algum tempo. Mas isso foi completamente destruído pelo bombardeio de Israel em Gaza durante a madrugada desta terça-feira (18).
Mas por que agora?
Por que Israel voltou à guerra?
O governo de Israel deu diferentes razões.
O ministro da Defesa do país, Israel Katz, disse que os ataques foram “devido à recusa do Hamas em libertar os reféns e às ameaças de prejudicar os soldados das IDF [Forças de Defesa de Israel] e as comunidades israelenses”. Se isso soa como o mesmo motivo que Israel deu para atacar Gaza desde 7 de outubro de 2023, é porque é. Os objetivos de guerra de Israel em Gaza são devolver os reféns restantes tomados pelo Hamas e destruir as capacidades governamentais e militares do grupo.
O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Israel, por sua vez, afirmou que os ataques ocorreram porque “o Hamas rejeitou duas propostas concretas de mediação apresentadas pelo enviado dos Estados Unidos, Steve Witkoff”.
Uma autoridade israelense também declarou que os ataques aéreos de Israel em Gaza nesta terça (18) são a primeira fase de uma série de ações militares de escalada destinadas a pressionar o Hamas a libertar mais reféns, marcando um retorno à visão do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, de que a pressão militar é a maneira mais eficaz de garantir a libertação de reféns.
A política interna israelense também é um grande fator.
A extrema-direita em Israel nunca gostou do cessar-fogo de Gaza, porque o vê como uma capitulação ao Hamas. Eles querem que todos os palestinos deixem Gaza e que Israel restabeleça os assentamentos que evacuou em 2005.
Netanyahu precisa dessa facção para governar. Um ministro de extrema-direita, Itamar Ben-Gvir, deixou o governo em protesto contra o cessar-fogo. Outro, Bezalel Smotrich, disse que sairia se Israel não voltasse à guerra. Isso teria destruído a coalizão governamental de Netanyahu.
Mas nesta terça-feira, o partido de Ben-Gvir – Jewish Power – anunciou que voltaria a se juntar ao governo. Essa é uma grande vitória política para Netanyahu e a estabilidade de sua coalizão.
O retorno do conflito em Gaza também distrairá do desejo de Netanyahu de demitir o chefe da agência de segurança interna de Israel, Shin Bet. Essa decisão, anunciada no domingo, atraiu pedidos de protestos em massa.
Tanto Smotrich quanto Ben-Givr acham que Israel tem sido muito tímido na condução da guerra.
“Esta é uma operação em fases que planejamos e construímos nas últimas semanas desde que o novo Chefe do Estado-Maior das IDF assumiu o cargo”, disse Smotrich nesta terça-feira. “E com a ajuda de Deus, será completamente diferente do que foi feito até agora.”
O que aconteceu com as negociações de cessar-fogo?
Israel e Hamas iniciaram um cessar-fogo em 19 de janeiro. A primeira fase deveria durar 42 dias. O Hamas deixou claro que quer manter esse acordo.
Sob os termos dessa segunda fase, Israel teria que se retirar completamente de Gaza e se comprometer com o fim permanente da guerra. Em troca, o Hamas libertaria todos os reféns vivos.
Israel deixou claro que quer novos termos. Queria que o Hamas continuasse libertando reféns em troca de prisioneiros palestinos – mas sem qualquer compromisso de acabar com a guerra ou retirar suas forças armadas.
Os dois lados deveriam discutir uma segunda fase a partir de 3 de fevereiro, mas o governo israelense ignorou o prazo.
Rompendo com décadas de tradição, os EUA começaram a falar diretamente com o Hamas, que considera uma organização terrorista. E Israel enviou equipes de negociação para o Catar e Egito, no domingo (16), “em um esforço para avançar as negociações”.
Israel diz que o enviado dos EUA para o Oriente Médio, Steve Witkoff, propôs uma extensão de um mês do cessar-fogo durante o Ramadã e depois a Páscoa no final de abril – mas sem nenhum dos compromissos que eles fizeram em janeiro. O Hamas rejeitou imediatamente o plano, dizendo que Netanyahu e seu governo estavam realizando “um golpe flagrante contra o acordo de cessar-fogo” que já havia sido acordado.
Ficou claro que os dois lados estão a oceanos de distância.
O Hamas se ofereceu na semana passada para libertar o soldado americano-israelense Edan Alexander, junto com os corpos de quatro outros cidadãos com dupla nacionalidade – presumivelmente quatro americanos-israelenses mortos. Em troca, eles disseram, Israel cumpre “o acordo de cessar-fogo de três fases assinado por todas as partes em 17 de janeiro de 2025”.
Israel chamou essa oferta de “guerra psicológica”.
A guerra recomeçou por completo?
Os militares israelenses deram muito poucos detalhes sobre sua operação. Seu primeiro anúncio disse que estavam realizando “ataques extensivos em alvos terroristas pertencentes à organização terrorista Hamas na Faixa de Gaza”.
Mais tarde, os militares ordenaram que os palestinos em grandes áreas de Gaza, a quilômetros da fronteira com Israel, deixassem suas casas.
Isso deu origem a especulações de que Israel pode estar preparando uma nova invasão terrestre – e pode até tentar ocupar centros urbanos em Gaza, algo que não fez até agora.
Após o cessar-fogo entrar em vigor em 19 de janeiro, Israel retirou suas tropas para as fronteiras de Gaza – com o Egito ao sul e com Israel ao norte e leste.
É improvável que Israel pare sua crescente ofensiva militar sem um acordo para libertar mais reféns, determinado a forçar o Hamas a negociar sob fogo.
Israel tem um plano para aumentar gradualmente suas operações militares em Gaza, disse o alto funcionário israelense, mas ainda não está claro quando o país poderá enviar tropas terrestres para o combate em Gaza novamente.
Por outro lado, o Hamas e seus aliados – que mataram centenas de soldados israelenses em Gaza desde 7 de outubro de 2023 – parecem até agora comprometidos com os termos do cessar-fogo existente, por enquanto.
Israel afirmou algumas vezes desde 19 de janeiro que foguetes de Gaza foram lançados, mas bem dentro do território. Eles, porém, não forneceram evidências disso, e o Hamas não lançou foguetes contra Israel durante os dois meses da trégua.
O que isso significa para os moradores de Gaza?
É devastador.
Esta terça-feira já é o dia mais mortal em Gaza em mais de um ano – desde 7 de novembro de 2023, quando 548 palestinos foram mortos.
Já faz mais de duas semanas que Israel bloqueou toda a ajuda humanitária de entrar em Gaza – uma resposta, segundo o governo de Netanyahu, à recusa do Hamas em concordar com os novos termos israelenses para a trégua. A guerra vai exacerbar esse sofrimento.
Após o novo ataque, multidões de palestinos foram vistas mais uma vez em movimento, ordenadas pelos militares a pegar o pouco que tinham e deixar áreas consideradas inseguras.
Ahmad Al Shaafi, que estava abrigado em Deir el Balah, disse à CNN que o bombardeio começou por volta das 2 da manhã.
“Os israelenses não têm nenhuma promessa com a qual estão comprometidos? Foi uma noite assustadora”, disse ele. “Só Deus é misericordioso. Ainda há duas crianças sob os escombros – uma de 5 anos. Não podemos recuperá-las.”
O Exército israelense matou cerca de 49 mil palestinos em Gaza desde o ataque do Hamas em 7 de outubro – a maioria deles civis – de acordo com o Ministério da Saúde do enclave.
“Alimentar o ‘inferno na Terra’ ao retomar a guerra só trará mais desespero e sofrimento”, disse o principal funcionário da Organização das Nações Unidas (ONU) para assuntos palestinos, Philippe Lazzarini, nesta terça-feira.
O que isso significa para os reféns?
É um golpe enorme. Ainda há 59 reféns em Gaza, dos quais se acredita que 24 estejam vivos.
As famílias dos que ainda estão presos estão indignadas.
“O governo israelense decidiu desistir dos reféns”, disse o Hostages and Missing Families Forum em um comunicado. “Estamos chocados, irritados e aterrorizados com o desmantelamento deliberado do processo para devolver nossos entes queridos do terrível cativeiro do Hamas.”
Qual foi o papel dos EUA?
Karoline Leavitt, secretária de imprensa da Casa Branca, disse na segunda-feira (17) que “o governo Trump e a Casa Branca foram consultados pelos israelenses sobre seus ataques em Gaza.”
O presidente dos EUA, Donald Trump, assumiu o crédito pelo cessar-fogo que começou pouco antes de ele assumir o cargo, e seus assessores desempenharam um grande papel em pressionar Netanyahu a aceitá-lo.
Mas ele também deixou claro que apoiaria Israel relançar a guerra.
“Estou enviando a Israel tudo o que precisa para terminar o trabalho, nenhum membro do Hamas estará seguro se vocês não fizerem o que eu digo”, disse ele em um comunicado no início deste mês. “LIBERTEM OS REFÉNS AGORA, OU HAVERÁ UM INFERNO A PAGAR MAIS TARDE!”
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