A galeria de “românticos” que vai abrir nos Jardins

Empreender é difícil em qualquer mercado, mas no de arte, ainda mais. Como a inspiração não bate ponto em horário comercial, a existência do produto é uma incerteza antes mesmo da demanda.

Por isso, as galerias grandes trabalham com o mercado secundário ou artistas reconhecidos, que têm uma colocação mais certa. Não há tempo a perder com uma aposta que demandará alta manutenção.

Uma nova galeria que abre essa semana está escolhendo o caminho mais difícil, mas talvez  mais prazeroso: só representar artistas iniciantes e apostar em artistas performáticos. 

Os três sócios – Monica Hollander, Matheus Yehudi e Sofia Pappi – se conheceram na galeria Mendes Wood DM. 

Sofia e Matheus, ambos de 30 anos, se conheceram trabalhando lá. Matheus ficou 10 anos; Sofia, 5. Não poderiam ter tido melhor escola: com espaços em Bruxelas, Londres e Paris, a Mendes é hoje uma das galerias mais interessantes e respeitadas do mundo. 

Matheus conheceu a colecionadora Monica Hollander em uma exposição na galeria. Tiveram “um encontro de almas” que fez com que Monica adotasse Matheus como filho. O desejo de começar algo novo uniu os três, e assim nasceu a Yehudi Hollander-Pappi, que abrirá no dia 22 na Alameda Lorena.

Experientes no mercado e cientes dos desafios, os três sabem que vão contra o zeitgeist. Eles topam o risco de representar iniciantes e lidar com a instabilidade da juventude criativa porque enxergam nesse processo tortuoso a melhor parte de ser galerista. 

Há nove meses trabalhando sem parar no projeto, Matheus e Sofia me contaram que buscam artistas que nunca foram representados por galerias antes. Dos 21 artistas contratados, 17 nunca tiveram galeria. 

São artistas sem infraestrutura para produzir, sem espaço fixo ou orçamento para comprar materiais de qualidade. Uma artista nunca tinha pintado em escala maior por falta de espaço. A galeria está provendo tudo para que eles possam criar. E essa troca tem sido muito rica para os dois lados.

Monica, a terceira sócia, construiu um ateliê para organizar residências artísticas em sua casa de férias em Americana. É lá que os artistas têm produzido as obras que serão apresentadas na abertura da galeria. 

“Temos acompanhado de perto o trabalho de cada um deles nos últimos meses, dando meios para criarem com mais recursos, dialogando sobre as obras e promovendo encontros com curadores,” disse Sofia.

 O relacionamento entre galerias e artistas pode ser muito intenso. Os três querem criar um vínculo com os artistas – como os galeristas do passado tinham quando o mundo era menos conectado. 

“Queremos trazer de volta o romantismo. Cuidar dos artistas, estimular sua produção, proporcionar a criatividade livre de amarras,” disse Matheus. 

Monica conviveu muito com Leonilson nos anos 80, uma amizade que foi fundamental para aprofundar sua compreensão de arte. Chegou a negociar uma sociedade com Thomas Cohn, mas com o Plano Collor precisou adiar os planos. 35 anos depois, a oportunidade surgiu com uma dupla jovem. 

“Quero fazer uma galeria para mostrar a arte de nosso tempo. O que nasce, vibra e se forma de maneira autêntica no espírito dos jovens como Renata Haar, criando formas delicadas e potentes no milenar mármore; Nathália Ivanov que traz a pureza da pintura; as imagens em tela e madeiras inusitadas e de formas impactantes de Luisa Alcântara, e Samuel Alves de Jesus nas aquarelas de sal.”

A galeria vai representar artistas que trabalham apenas com performance: Davi Pontes – que participou da última Bienal de São Paulo, Iara Izidoro e o grupo de teatro não convencional, MEXA.  Também querem trazer artistas digitais, como Gabriel Massan, que acaba de concluir uma mostra individual na Pina Contemporânea e vai abrir um solo muito especial no MAR, no Rio. 

A exposição inaugural, intitulada SUPERNOVA 1572, vai mostrar os 21 artistas junto com nomes estabelecidos para contextualizar a prática dos jovens.  Além da abertura, a galeria estará nas próximas feiras de São Paulo: SP-Arte e ArPA.




Rita Drummond




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